Regina Bostulim: Poesias e Minicontos

MAKE UP (miniconto) - Maquiagem? Nunca usei maquiagem na vida. Ao invés disso, li as obras completas de Shakespeare.


HOKUSAI
(hai-kais sobre o mundo gueixa)

O SONHO DA MULHER DO PESCADOR
fagueira fogueira
guelra de peixa, deixa
gueixa e riquixá



JARDIM DE INVERNO
sentimento fosse ave
antes ver você
debaixo do salgueiro



OKYIA
jovem maiko -
flores de cerejeira
neste céu de Kyoto


DIVÃ DO TAMARINDO
(transcriações de autores orientais)

RUBAYAT XI
pão, vinho, uns versos
sozinha no mato -
que paraíso a solidão
(omar khayyam, transcriação: regina bostulim)


SOL DE TABRIZ
sol de Tabriz:
neve que se derrete,
lambida de terra.
névoa de alma,
retorno ao sol.
(jalal ad-din muhammad rumi, transcriação: regina bostulim)






AS BRUXAS DE ANTONINA II
(miniconto)

Da tradição oral de Antonina.*

Seu Neguinho da Feira Mar conta que quando era pequeno, uma criança começou a ter “doença de minguar” perto de sua casa.
A mãe não sabia o que a criança tinha, mas a criancinha estava já sequinha, magrinha, e não melhorava de jeito nenhum.
Então a avó da criança resolveu ficar a noite em claro cuidando da criança. No meio da noite, desceu uma fita cor-de-rosa do teto, se aproximando da caminha da criança.
A velha avó da criança pegou uma tesoura e cortou a fita bem no meio. A bruxa que estava em cima da casa urrou, e no outro dia, uma mulher em Antonina tinha perdido metade da língua.


Complexo de Lou Salomé
(poemas-saudade)


PARA CAIO FERNANDO ABREU

olhos negros, fundos, intensos,
que capturaram luz

por você escrevo
e já não importa

por você escrevo
e continuo
dando voltas
murros
pontas de facas


PARA MARCOS PRADO

brincava com as borras
no copo de café
e assim
ia desenhando o poema
como se percorresse o corpo
da mais bela mulher
no final assinava
os poemas que tinha feito comigo
com letras de imprensa
em caixa alta
JAMES DIMPLE
eu  também assinava ao lado
STREGA LIQUEOUR
ficava assim sem intervalo
JAMES DIMPLE STREGA LIQUEOUR





Corvo - Kirkland - Washington- Esados Unidos
Fotografia de Isabel Furini
RAVEN-NEVER
(transcriação)

meia-noite
alguém raspa minha porta
dezembro
e soluços poe-Lenora
meu coração repetia
isso e nada mais
implorei
mas a raspada continuava
na porta do quarto
escuridão e nada mais
sonhando sussurrei "Leoa"
tudo isso e nada mais
alma ardente
vento e nada mais
som de flauta
e nada mais
pássaro de ébano
noite de plutão
disse o corvo
"nunca mais"
o pássaro acima da porta
diz um nome como "nunca mais"
sobe num busto
e o pássaro repete
"nunca mais"
dúvida, melancolia
nunca mais
roupa de veludo
nunca mais
lâmpada a gás
nunca mais
perdida Lenora
nunca mais
tempestade, casa assombrada
nunca mais
anjos e a donzela Lenora
nunca mais
minha solidão
nunca mais
o pássaro preto
sobre o busto de Pallas
diz pela última vez
nunca mais

(edgar allan poe, transcriação regina bostulim)



MEMENTO MORI
(hai-kais sobre morte)

SÃO JOÃO
que o santo não me enjeite -
no fim da vida
só me restou o sabugo

HORROR STORY
sonho americano -
décadas depois de morta
ainda lembram seus escritos


REGINA BOSTULIM - Artista multimídia. Escritora, artista plástica, artesã. Publicou cerca de 40 livros em formato papel. Publicou também em formatos eletrônicos (e-books, sites, portais, redes sociais). Estudou Letras (doutoramento) na Universidade de Coimbra. Ganhou o Prêmio Nacional de Poesia Helena Kolody. Foi publicada por jornais de cultura paranaenses (Memai, Cândido, Mallarmargens). Publicou no Exterior. Realizou exposições de arte internacionais. Possui livros em bibliotecas estrangeiras.

Livros disponíveis à venda em:
Insight Edições Artesanais (Rua Voluntários da Pátria, 522, Curitiba).
www.livrosartesanais.com.br


Comentários

  1. Bendiciones, Isabel y Carlos, muchas GRACIAS, por todo. Diós les bendiga, siempre.

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