Isabel Furini: Entrevista com o ator e diretor de teatro THADEU PERONNE

Nosso entrevistado é Thadeu Peronne, Bacharel em Artes Cênicas PUC-FTG, há 25 anos que se dedica de corpo e alma ao teatro, ele é ator, produtor, diretor, professor teatral e captador de recursos.

Você tem anos de trabalho na área de teatro, em sua opinião que tipo de peça exige mais concentração, mais trabalho do ator?




Todas exigem o máximo de concentração é preciso estar concentrado sempre!

Bem, quanto a dar mais trabalho, tentarei ser sucinto. Enquanto ator nos dá muito trabalho no teatro quando temos uma arquitetura artística extremamente complexa e pouco tempo para estruturá-la. Isso envolve desde o cronograma de ensaio a complexidade dramatúrgica, a concepção do diretor e todos os outros elementos de criação que compõem a cena e vai até o cumprimento da temporada. É algo complexo de se falar.

Quanto à produção, vários pontos podem dar muito trabalho, por exemplo, quando as equipes não estão cem por cento no projeto, ou quando há ineficiências contínuas e atrasos, isso faz queimar o cérebro do produtor, pois exige muita paciência e ao mesmo tempo controle emocional. Também quando o diretor resolve mergulhar em exageros técnicos muitas vezes impossíveis de serem realizados com o orçamento. E tantas outras complexidades presentes numa montagem desde o início até o fim. Mas no meu caso sempre tento estar presente a cada passo – começar e terminar com competência, hoje em dia tenho trabalhado com pré-produção antes da produção em si, é necessário. Levantar a segunda temporada de “AmorexiA” agora em 2016, está me dando muito trabalho no sentido de acertar agendas e conseguir novos patrocinadores. Mas aos poucos, as coisas vão tomando seu lugar. O teatro é sempre um recomeço.



O espetáculo é lindo e em seus primeiros momentos tivemos a sorte de já termos conseguido um ótimo retorno de público e de crítica, mas temos muito ainda pra fazer. Viajar, por exemplo. Temos de ser gratos a todos que acreditam nos nossos sonhos, nas nossas loucuras artísticas. Não suporto ficar com espetáculo parado. Viajar é preciso, mas a trabalheira é enorme. Pode imaginar o trabalho que é levantar um projeto, pré-produção, produção, entrar em cartaz se dividindo em várias funções?

É assim que fazemos com espetáculos de baixo orçamento. No meu caso sou muito grato a todos que têm estado comigo, pois desde quando nasceu “AmorexiA” tenho recebido apoio total de todos os artistas, do elenco, do pessoas da criação técnica, dos empresários e do Teatro Guaíra e demais colaboradores.

Não tem muito segredo é acreditar e trabalhar. No geral todo espetáculo nos dá muito trabalho, muitas e muitas vezes o público não tem a menor noção, mas fazemos tudo com muito amor.

Foto de David D'Visant

Thadeu, você é ator, diretor e produtor teatral. Como diretor precisa escolher os atores que participarão na peça, como acontece essa escolha? Se vários candidatos são bons para representar um personagem, como você decide qual será o melhor? 

Depende muito, algumas vezes opto pelo time com os quais já costumo trabalhar ou pesquisar. Outras vezes, o texto pede um ator específico, um ator ou atriz que detenham determinadas técnicas que atendam à linguagem proposta para aquele trabalho, daí tenho que atender a esse pedido. Em outras vezes, até faço teste para oportunizar esse encontro. Digamos que costumo ouvir as personagens, elas me orientam. Acredito que o próprio ator ou atriz conquista o papel. Mas, existe sim, um olhar técnico e estético que aplico.

Como diretor você sempre tem de estar com um olhar para o todo, isso me ajuda muito a definir.
Não tem meio ator ou é ou não é! O ator tem de estar preparado para mergulhar fundo na trajetória da personagem, muitas vezes o mergulho tem de ser profundo, o ator tem de demonstrar que pode dar esse mergulho e voltar renovado. Todo diretor tem de ter essa percepção sobre seu elenco. Se nos enganamos, às vezes sim, mas no geral acertamos.

Quais são as características mais importantes para o crescimento de um ator de teatro? Ele precisa de algum talento especial?

Eu acredito na tríade: Talento, técnica e humildade!
O ator deve observar o mundo e se observar se conhecer, saber do seu talento, usufruir dele, disponibilizá-lo para cada trabalho. A Humildade dará ao ator o chão, ele deve seguir estudando muito, aprendendo com os mestres, seguindo seu caminho, deve conhecer seu corpo, seu ofício, nunca se deixar cair por perdas ou ganhos. Ser ator é desafiante. É preciso dedicação e disciplina e muito AMOR por si próprio, pelo Teatro e pelo público. É preciso ser generoso. É preciso ter coragem. Ser imparcial no trato com o texto e com as personagens, jamais julgá-los. Deve cuidar da saúde e praticar atividades físicas e aulas de canto e dança. A técnica jamais deve se estagnar e é preciso se reciclar o tempo todo. Não se prender a interpretações estereotipadas, vícios de voz e de corpo, deve se moldar como massinha. Voz e o corpo devem estar inteiros.

Todos interpretamos desde muito cedo, então não sou eu quem vai dizer que o ator deva ter um talento especial, é ele próprio que vai se descobrindo e, é claro a vida vai lhe sugestionando. O TEATRO É UM CHAMADO é preciso ouvi-lo.

Hoje muitos pais estão apoiando seus filhos para que sigam a carreira teatral.

É preciso entender muito cedo que a segurança a fama e o dinheiro fácil não fazem parte necessariamente da vida de um artista de teatro, embora ser ator seja uma escolha maravilhosa, um mergulho no desconhecido caminho da poesia e das artes é preciso entender que ser artista é uma coisa, ser famoso é outra, as duas podem se coincidir mas necessariamente não caminham juntas.

Ser reconhecido faz bem e todos gostamos muito! É preciso saber aproveitar as oportunidades da vida. O Cinema e a Televisão são linguagens maravilhosas para se representar e também são opções para o ator de teatro.

Quais são os atores e diretores de teatro que você admira?

“Admiro todos os atores que se dedicam de corpo e alma ao fazer teatral e que estão em constante trabalho de reciclagem! Que continuam na estrada superando todos os desafios da vida! Que são verdadeiros. Viscerais.”

“Admiro também todos os diretores que conseguem levar para a cena muitas das diversas inquietações propostas pela dramaturgia, estabelecendo um potente diálogo entre todos os elementos que compõem a cena acreditando sempre que no teatro, o ator é o senhor da cena.”

Citar nomes é complicado. No Brasil temos excelentes atores e atrizes, muita gente boa, muitos ótimos diretores!

Amo muito os artistas com quem tive a oportunidade de trabalhar e trabalho.

Cito aqui alguns inspiradores em nível mundial: Isabelle Hupper, assisti essa incrível atriz no Teatro em Psicose 4:48 no e ainda tive a oportunidade de lhe fazer perguntas numa mesa redonda. Muito humilde e completamente concentrada. Fiquei impressionado com sua postura. Ela atua no teatro e no cinema desde pequena daí sua tranquilidade com a câmera. Maravilhosa!

Willen Dafoe, grande ator, ele é gigante no teatro e no cinema, um verdadeiro exemplo de trabalho, humildade, talento e dedicação. Pude assisti-lo agora em The Old Woman (A Velha Senhora) sob a direção do Bob Wilson.
Kazuo Ohno, maravilhoso até o fim!!

Os diretores multiartistas : Tadeusz Kantor , Gerzi Grotowski,Peter Brook, Bob Wilson ,Theo Angelopaulos , Victor Garcia, Antunes, Zé Celso, Gerald Thomas entre outros grandes!!!

Como é a criação dos seus personagens, onde você busca a inspiração? Nos livros? Na vida familiar? Na rua? Nos bares? Falando com pessoas?

É preciso estar aberto para a as sugestões do texto. O ator é uma legião de arquétipos, acredito nisso. A técnica me ajuda para dosar, lapidar as personagens. Eu observo muito a vida, tudo e todos, faz parte da vida de um ator observar. Mas as personagens devem nascer pela respiração. As artes plásticas também me auxiliam. Faz tempo que pinto meus personagens, vivo o pictórico.

Eu crio as personagens e depois me livro delas, que difícil (risos). Às vezes amo e odeio personagens. Somos todos eles não é? É preciso estar atento a tudo!!!

Dionísio e Apolo ali presentificados nas diversas camadas de composição. Na medida em que os busco fora, eles se aprofundam dentro de mim.


Thadeu Peronne -Foto de Lu Gomes

Qual a diferença entre teatro e televisão para o ator? Qual exige mais esforço para representar?

A essência é a mesma, porém se diferencia na técnica. Para a câmera menos é mais. Tudo muito delicado. O cinema é maravilhoso, pois eterniza verdadeiras obras de arte. Particularmente amo o cinema tanto quanto o teatro, por sua visceralidade. Uma boa personagem, um bom roteiro, um bom diretor e equipe é tudo na vida de um ator. O teatro exige o ator de corpo e alma, literalmente e abre para os artistas incomensuráveis possibilidades de linguagens vocais e corporais. Teatro é uma arte viva, orgânica, um ritual. Concordo também que a Televisão é do patrocinador, Cinema do Diretor e Teatro do ator!

Quanto ao esforço eu diria que em todas as áreas podem exigir muito. A televisão brasileira, por exemplo, é uma das melhores do mundo, grandes artistas de teatro se dividem na televisão. Existem ótimos trabalhos de televisão que exigiram sim, um grande esforço de todos. Filmes também. Acredito que o esforço está intimamente ligado ao esforço de todos em construir uma OBRA DE ARTE em ambas as áreas.

Quando e como foi a sua estreia como ator? Qual foi a sensação de atuar pela primeira vez?

O teatro vem comigo desde criança. Porém como profissional eu diria que minha primeira oportunidade veio com The Baile II do grupo musical Abominável Sebastião das Neves no SESC da Esquina sob a direção do Márcio Mattana , logo na saída da Letícia Sabatella. Eu era jovem e o Zeca Wachelke (in memoriam) me convidou, música, teatro e comédia juntos, foi incrível. Depois vieram os espetáculos do Tanahora da PUC PR E peças da Faculdade de Artes Cênicas etc.

A primeira vez lá no SESC com teatro lotado e uma cena solo, foi incrível. Até hoje a cada estreia sinto esse calafrio. Um prazer enorme, puro amor!

Mas, voltando o tempo eu comecei cantando em shows de calouros no interior onde nasci e depois representava personagens populares em encontros estudantis. Naquela época encarei um palhaço e o público veio abaixo de tanto rir, coisas lá de traz. Mas quem me conhece sabe que desde pequeno eu me jogo na comédia. Acho que já experimentava esse stand up comedy lá atrás ahahah.

Thadeu Peronne - Foto de David D'Visant




Tem preferência por representar algum tipo específico de personagem?

Não, antigamente gostava mais de comédia, hoje em dia me divirto a beça com os dramas.

Teatro é pura diversão, prazer e alegria, sempre!

Não falamos dos dramaturgos. Um bom texto, uma boa dramaturgia é tudo pra um ator. Como é importante para um ator poder representar um bom texto.

Eu já tive várias oportunidades. Shakespeare é absolutamente incrível.

Nelson Rodrigues é demais não é? E tantos outros maravilhosos. Eu acredito na geração de novos autores.





Depois da noite de estreia, como é possível mensurar a reação do público? As opiniões do público e da crítica nem sempre coincidem, qual delas você acha mais importante?

Depois da noite de estreia, é maravilhoso!!! A cada peça teatral uma nova experiência, necessariamente o teatro não tem que agradar, mas comunicar sim. Se há ruídos demais e a obra de arte navegar pelo incognoscível e você não tiver seu termômetro, isso poderá ser terrível. Durante a apresentação de estreia já é possível saber porque o público reage, de maneira visível ou invisível. É possível sentir a energia. No geral na estreia, além do nervosismo, também sempre estou muito feliz e grato por tudo e por todos. O teatro é um grande encontro já disse o poeta.

Faço teatro para o público sempre! Obviamente que a crítica especializada e imparcial, muito me interessa. Mas estamos muito carentes de crítica especializada no país. É muito legal poder ler uma crítica inteligente sobre a peça perceber que o crítico entendeu muito do que colocamos em cena, dos nossos riscos. Mas não há concessão e muitas vezes a crítica pode ser implacável. Isso é triste.

Gosto das críticas do inesquecível Décio de Almeida Prado (Exercício Findo). Tive uma professora incrível na Faculdade de Artes Cênicas, Marilu Silveira, ela nos orientou muito nesse quesito. O Laercio Ruffa também era muito crítico conosco, nos orientava muito na época do Tanahora. O Antunes Filho também orienta seus atores sobre a questão da crítica.

A verdadeira crítica teatral é aquela que aponta novos horizontes, para se acertar é preciso arriscar e às vezes o risco é grande, mas um puxão de orelha sempre é bom não é?

É muito bom quando ao ler uma crítica percebemos nas entrelinhas respeito e sabedoria do crítico. Quando um crítico nos aplaude em pé mais lindo ainda. É bom ler críticas positivas faz bem. É uma pena que tenhamos tão poucos críticos no país e que os jornais não invistam tanto nesses profissionais tão necessários.

Thadeu Peronne - Foto de David D'Visant

Thadeu, fale de seus planos para 2016.

Olha, “AmorexiA” 2016 deve voltar com tudo, meus queridos companheiros de estrada continuam comigo e isso é incrível, sou muito grato. Estou em fase de pré-produção, em busca de novos patrocinadores. Teatro, cinema, aulas, cursos, jurados de Festivais etc. Será um ano maravilhoso, estou solidificando a Thadeu Peronne Produções Artísticas para atender o mundo corporativo e viabilizar muitos projetos artísticos!!!

Até lá poderemos conferir “Vladson” um telefilme no qual tive a oportunidade de atuar.

Muitas surpresas virão por aí, aguardem!

Quero montar uma sede, um lugar que possa se transformar num local de pesquisa de linguagem e encenações para meus trabalhos e para tantos outros amigos. Um local para central onde possamos abrir para a comunidade de toda a cidade. Que todos juntos possamos construir um país melhor, com arte, cultura e educação mais acessíveis.

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