Mary Trezub: Sobre teatro e dança na atualidade

Poderia começar, dizendo que o mundo está perdido, que as coisas andam mal, que a arte está com os valores equivocados, mas isso iria contra os meus princípios, pois sendo eu bailarina, coreógrafa e atriz, quase da velha guarda e vindo de um tempo em que tínhamos ainda censura e grandes dificuldades em acessar algo que fizesse pensar, tenho a missão de semear, em terra boa ou ruim: Esperança.

Comecei a sonhar muito cedo, ainda sem saber escrever, segundo minha mãe, eu já pedia"ápis", lápis e papel para me expressar nas madrugadas e sendo assim, já que fui alfabetizada, iniciei esse processo de semear e quando tive acesso a minha primeira aula de ballet, aos 4 anos de idade, fui
fazendo um rascunho do caminho que trilho a 45 anos. Frequentei o curso de danças clássicas do Teatro Guaíra dos 6 aos 17, comecei a dar aulas para crianças já aos 13, por pura necessidade e amei.

Tive aulas com professoras maravilhosas como Rita de Cacia Monte Correia, Eva Shull e Rita Pavão, Jo Braska Negrão e Ana Botafogo, Ingressei no curso de Artes cênicas e dança aos 19 e o mundo se descortinou completamente para mim...

Entre megeras e fadas, fui conhecendo e expressando e dançando, cada vez mais nos palcos, nas salas e em qualquer lugar que pudesse acessar corações. Sim, porque para mim, se não acessar corações, de nada vale teatro, dança e tudo que essas artes podem representar. Não comungo com a ideia de não existir enredo, por mais contemporânea ou livre que seja a arte, ela deve nos fazer pensar e esperar momentos melhores.

Na atual situação de caos mundial, como artistas temos a obrigação de trazer leveza, sim, porque choques de realidade e violência , temos gratuita e diariamente. Trato ainda a arte da minha dança e teatro como na sua essência, como etérea fumaça perfumada que adentra olhos, ouvidos, nariz e boca para chegar ao coração.

De nada adianta um belo cenário, que apenas choque, ou sem cenário, que leve a plateia ao horror, disso já estamos contaminados e não sou eu que vou engrossar essa fila, ao contrário, quero fazer sonhar, quero inspirar...

Só que é um caminho tortuoso nesse nosso país que não nos apoia em quase nada, lei de incentivo é para uma minoria escolhida a dedo e as contas bancárias de poucos, da panela, engordam de acordo com a mídia concordata.

Mas, mesmo assim, sigo tentando nas aulas que dou para crianças e pré-adolescentes, trazer de dentro deles o material necessário para se libertarem de seus casulos e alçarem vôo. Tarefa difícil hoje em dia, com tudo mastigado pela internet e celulares e pcs de última geração, apelando para a comodidade. Mas, vamos lá, não me intimido e na medida do possível, do meu entendimento, também me aproveito um pouco dessa maravilhosa tecnologia, que deve ser manipulada por nossa cabeça e não ao contrário.

Acredito que o teatro é uma excelente ferramenta na luta contra a exclusão e timidez generalizadas e a dança dá a técnica e o desenvolvimento corporal, que enriquece e prepara ainda mais novos artistas.

Hoje na dança, ainda temos nomes como Ana Botafogo, Eleonora Greca, Cecília Kerche, bailarinas

Clássicas, contemporâneas minhas, que vale muito a pena acompanhar e pesquisar seus trabalhos.
Atualmente, estou na direção artística e atuando em um Musical infantil, de Triana Ballestá, que foi minha aluna de ballet e jazz, hoje atuamos juntas e tem sido muito prazeroso, perceber como podem haver trocas entre nós em palco e da plateia para o palco também, de uma energia tão boa e tão pensante! Buscando, além da técnica da dança ou do teatro de cada uma, essa energia que bate e volta, nos transformando e também as crianças e pais ou acompanhantes adultos que nos assistem.

Sempre há um feedback positivo ao final dos espetáculos e é assim que deve ser. Embora, ainda
estejamos no período de captar recursos próprios e o público tenha sido escasso, vamos indo, que em cada coração que tocarmos, nos renderá outros próximos! E temos que acreditar que sobreviveremos, não somente emocional, mas economicamente, ainda da nossa arte um dia...

Do ballet e suas raízes com Luiz XIV, Giseles, Cisnes, Quebra Nozes, óperas como Carmem de Biset, ou grandes peças teatrais de Shakespeare até as pequenas obras que surgem das cabeças pensantes de nosso alunos ou plateias, vamos indo, colorindo esse mundo que teima em ser tão cinzento as vezes.

E aos medíocres, também agradecemos por nos ensinar como não fazer.

Aproveito para citar uma estrofe da música que fiz para um espetáculo de dança atual:

"...E um dia a Terra vai ser um Pomar e as pessoas frutas fortes, livres da incerteza e de todo o mal, como num dia de Natal!"

Mary Trezub


Mary Trezub é atriz, bailarina, professora e coreógrafa, de ballet e jazz, com formação clássica pelo BTG, Baby-class por Ana Botafogo, curso parcial de Artes cênicas pela PUC-PR e extensão 
universitária de Didática da Dança pela Faculdade Dr. Bezerra de Menezes ( Espírita-PR).
Resumo de Currículo artístico: Atriz na Ditirambo Produções Artísticas, direção de Salete Cercal- 1995; Atriz e manipuladora de bonecos, no Festival Internacional de Bonecos de Curitiba, 1997, sob direção de Sandra Pires, realização Fundação Cultural e Teatro Guaíra; Atriz, produtora bailarina nos Espetáculos artísticos da Inspiração Academia de Danças, Sesc Portão, 3ª idade e Da Esquina, de 1997 a 2003; Atriz convidada como narradora do Espetáculo de dança egípcia,"Do Báladi ao Ventre", de Triana Ballestá, 2013; Atriz das Peças Espíritas adaptadas por Rodrigo D'Oliveira, Festival de Teatro de Curitiba 2014; Atualmente atuando como atriz e diretora artística, na Peça "Mil e uma noites para crianças" de Triana Ballestá. Como professora de ballet e jazz na Energiarte e coreógrafa do grupo Inspiração.

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