Carlyle Popp - Entrevista realizada por Isabel Furini


Nosso entrevistado é o escritor Carlyle Popp, autor do romance O Senhor de Minha História (Editora InVerso, 2016). Carlyle é Mestre em Direito Público pela UFPR. Doutor em Direito Civil pela PUC/SP. Membro do Instituto dos Advogados do Paraná, da Academia Paranaense de Letras Jurídicas, do Conselho Editorial da Juruá Editora, do Instituto de Direito Privado e da ALUBRA. Professor dos Cursos de Graduação e Pós-Graduação (mestrado) do Centro Universitário Curitiba (UNICURITIBA) até 2012. Advogado Sócio de Popp & Nalin Advogados Associados.   Professor licenciado da PUC/PR. É escritor. Organizador e colaborador das antologias Instruções à Cortázar: homenagem de cronópios, famas e esperanças. Juruá Editora, 2014 e  KAFKA: Uma metamorfose inspiradora. Juruá: Curitiba, 2015.



Quando iniciou o seu interesse pelos livros? E quando surgiu o desejo de ser escritor?

Minha família, sobretudo meu pai, tinha um contato muito próximo com os livros.  Assim, sempre convivi com eles e aprendi a importância de ser um bom leitor. Contudo, comecei a desenvolver mais minhas leituras a partir do final da adolescência. Meu desejo de ser escritor nasce  durante a faculdade, mas sobretudo com o desenvolvimento de minha vida acadêmica enquanto professor de direito. A realização de mestrado e doutorado,  e a publicação de livros e ensaios técnicos também colaboraram com este anseio.

Quais são seus autores preferidos?

Os mais importantes são sempre aqueles lembrados imediatamente. Vamos lá: Jean Paul Sartre, Julio Cortázar, Philipe Roth, Carlos Heitor Cony e Lúcio Cardoso. Estes, porém, são os  prediletos, mas minha leitura é muito eclética.  Na ficção leio de tudo, embora fantasia e ficção científica não sejam o meu forte.  É claro que numa relação mais ampla não se pode olvidar de Machado de Assis, Gore Vidal, Lima Barreto, Gustave Flaubert, Ernest Hemingway, Antonio Tabucchi e Roberto Arlt.

Quantos livros você consegue ler por ano (aproximadamente)?

Quando comecei a me dedicar mais à ficção tomei o cuidado de fazer uma lista mensal dos livros lidos. Nesta somente computo livros. Estão excluídos contos esparsos, capítulos e,  também, livros técnicos jurídicos. Posso afirmar, então, sem medo de errar que leio entre 10 e 15 livros por mês, ou seja, aproximadamente 150 livros por ano. Parece um número elevado, mas estou certo de que se não comprar mais nenhum livro até o final da vida, não conseguirei ler os que já  figuram em minha biblioteca. A resposta é simples, compro   mais do que leio. É uma grande frustração.

Como foi a experiência de escrever seu primeiro romance?

Se fosse resumir em uma única palavra diria: fascinante. Foi um trabalho construído aos poucos. O primeiro capítulo foi escrito por volta de 1989.  Deixei-o guardado. Nunca mais o peguei. Somente retornei a ele em 2012 quando comecei a fazer algumas oficinas literárias, entre as quais quatro ou cinco contigo. Só que nesta época o capítulo escrito, ainda à maquina de escrever, não estava mais comigo. Desapareceu junto com uma pasta azul onde arquivados estavam outros escritos. Reconstruí-o de memória e, a partir de então, comecei a estabelecer mentalmente o que pretendia com aquele capítulo. O começo e o fim, assim como a história em semente formaram-se em minha cabeça. O conteúdo foi se concretizando  à medida em que era escrito. Diverti-me muito.

Você organizou dois livros de contos. Qual foi sua maior dificuldade no momento de organizar o livro? 

Em geral a maior dificuldade é com  os prazos. Não foi o que aconteceu nos projetos Cortázar e Kafka. Nem tampouco difícil foi conseguir colaboradores. Jovens e consagrados escritos aderiram à ideia. Houve muita gentileza de parte daqueles que já dotados de grande experiência. Confiar  em um organizar neófito é para poucos. O mais árduo,  a única grande dificuldade do projeto, foi o momento da autorização   dos direitos de publicação. Aí pontos que para o pessoal do direito são absolutamente comuns e tranquilos, passaram a se constituir em dificuldades intransponíveis. Não tanto assim porque, com algum transtorno é verdade, foram superadas.



Carlyle, conte como surgiram os personagens do romance O Senhor  da Minha História?  


Todo escritor se vale de experiências pessoais. Isto não significa, porém, que o romance seja autoficção, memorialístico ou não ficção. É inteiro ficcional. Apelidos de amigos de infância, como Pinocchio, Fêmea e Tetão são reais. Os personagens, porém,   são imaginários.   Foram criados da realidade observada, mas principalmente do imaginário. Os lugares retratados são de meu conhecimento, mas as cenas são ficcionais. Por completo. Aliás, em alguns aspectos não seria de todo ruim se se constituísse em experiência real (rsrs). É bom que se diga, por fim, que dentro do pacto ficcional tudo aquilo foi verdade.





Alguns autores confessam que uma obra surge em um determinado ambiente.  Como é seu processo criativo? Qual foi o ponto de partida do livro?

O ponto de partida foi o capítulo escrito no final dos anos 80. Ele acaba com uma afirmação do protagonista. Ele entrava em um quarto e percebeu que não estaria sozinho. Quem estaria com ele? Como o protagonista chegou ali? Como foi a vida deles? A partir da resposta a estas perguntas a história foi sendo construída. O único ponto de apoio era a relação de infância entre o protogonista e o antagonista. Tudo nascia dali. Uma relação de amor, inveja, ódio e vaidade. Todo o resto foi construído. O romance foi sendo elaborado aos pedaços, sem ordem sequencial, o que demandou um trabalho de edição ao final. A escrita se deu  em bares, oficinas literárias, em minha casa. O campo de anotação do celular foi útil. Frases ouvidas, situações observadas passaram a compor a história. Há, porém, ambientes que reclamam o trabalho do escritor como uma boa paisagem ou um quarto de hotel.

Teve algum personagem ou alguma cena que foi muito difícil de escrever?
A parte mais difícil foi em relação à  estrutura geral da história, ou seja, demonstrar o crescimento do ódio e da inveja para que não parecesse fortuito. Verossimilhança. Por que alguém quer matar outra pessoa? Detalhes durante o texto foram semeando este crescendo. A última parte do livro, onde a loucura do protagonista seria mais enfatizada também teve certa complexidade, a principiar pela voz narrativa. Inicialmente em terceira pessoa, ao final, alterada de forma a seguir o mesmo narrador de todo o texto, ou seja, o protagonista. A própria falta de nome do narrador visava a enfatizar seus problemas de identidade. O texto mais trabalhado foi o de Londres, o momento em que dois personagens se encontram sobre a ponte um deles mata o outro. Ou acredito tê-lo feito. Deste capítulo talvez surjam mais dúvidas que verdades. Sempre gostei de elaborar finais abertos. A conclusão sempre deve ser do leitor.


Como foi a resposta do público e da crítica?
A crítica ainda não se manifestou. Espero que ainda o faça. As pessoas que leram, sejam acadêmicos ou leitores em geral, responderam muito bem. Acima das expectativas. Inclusive recebi retornos que elencavam algo como: “aquilo aconteceu comigo. Igualzinho”. São as maravilhas do processo ficcional. A vida é muito mais criativa do que a ficção.


Falemos de 2017. Quais são seus objetivos no campo da literatura em 2017?
O projeto é dar continuidade a um romance que já está arquitetado. A história também se passa em Curitiba. O protagonista será o Bóris, personagem do Senhor da Minha História. Um legítimo curitibano. Ele e seu mau humor constituirão meu próximo desafio.

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