Regina Bostulim: Batista de Pilar - príncipe sem trono

Texto de Regina Bostulim - artista vêneta, 
pesquisadora do Instituto de Estudos Clássicos, 
da Faculdade de Letras, Universidade de Coimbra, 
Portugal.
Batista de Pilar, poeta, performer (esq.) e João Bello, escritor, violeiro, compositor, titeretista, performer, ativista. Ao fundo, Campo Grande (esq.) violeiro, cantor, compositor, autografa cds comprados por um fã de seus discos. Todas as artes e seu público se encontram na Feira do Poeta, Largo da Ordem. Muitos artistas são fãs de seus colegas artistas.
(Foto: Regina Bostulim).

Batista de Pilar é considerado “o maior poeta”, não só de Curitiba, como do Paraná. O motivo é a qualidade de seus textos. E também porque Batista vive uma vida digna de ser vivida, uma vida coerente, e condizente com a vida de um verdadeiro poeta maldito.

Batista, do alto de seus inúmeros livros, palestras, do alto da fama, vive nas ruas. Não só vive nas ruas, como se alimenta do que lhe pode ser doado. Também veste o que lhe é doado. Na chuva, no frio, no abandono, “o maior poeta da cidade”. Nas noites chutado e vilipendiado, assaltado, violado. Doente, sem médicos, remédios, nem internação em hospital especializado, como qualquer ser humano, pelos mais básicos dos direitos humanos, mereceria. Barbudo, cabeludo, fedendo, nem mesmo as campanhas de esteticistas aprendizes do Senac, para indigentes, o beneficiam. O chuveiro existente na Feira do Poeta retirado, para que poetas carenciados não possam tomar banho. Sem amor nem carinho de uma família amorosa, jamais se casou ou teve filhos, dedicou sua vida à cruel labuta pela poesia paranaense, divulgando a arte e artistas do Estado.

Regina Bostulim e Batista de Pilar.(Foto: Eduardo Merlin)
Batista e Fredy,
“enfant terribles” da Feira

 Como se isto não bastasse, os próprios poetas lhe franzem o nariz. Batista, e outro genial poeta, chamado Fredy, são odiados, apenas porque não cheiram a caras colônias, mas emanam o cheiro das calçadas onde dormem.

No entanto, muitos dos que lhe franzem o nariz não têm publicações, nem mesmo virtuais. Muitos destes poetas sem coração ocupam academias, recebem honrarias, são mencionados em jornais e antologias cult. Batista recebe o esquecimento, porém escreveu e publicou tantos livros que nem dá para se contar. Palestrou nos eventos mais importantes da história do Estado, lado a lado com ganhadores paranaenses do “Oscar da literatura nacional” - Prêmio Jabuti - como Wilson Bueno e Alice Ruiz. Batista podia ser visto nos eventos mais importantes, com o gênio da terra dos pinheirais, Paulo Leminski, ou com o gênio da urbe, Reinoldo Atem. Só isto já basta para colocá-lo como um dos maiores escritores do mundo. Mas sua obra é magistral, tão peculiar quanto a de Patativa do Assaré, outro poeta de grande oralidade. Batista brilha com as novas tecnologias, no Youtube estão disponíveis inúmeros vídeos mostrando seu lado declamador. Declamou nos maiores palcos do Paraná. Brilha nos eventos da Feira do Poeta, organizado por um dos coordenadores da Feira, Geraldo Magela, no Teatro Universitário de Curitiba, em shows denominados Falações Poéticas. Em seus urros poéticos o acompanha a banda Skarrei, de Felipe Pacheco, banda que vem resgatando o skank e o punk  da cidade, e até mesmo o mais tradicional ritmo caiçara do Estado, que é o fandango. Também no Sarau Popular, shows para o público das periferias, comandados por Getúlio Guerra e pelo outro coordenador da Feira do Poeta, Luíz Brizola, eis que surge Batista, gritando pelos bairros da cidade seus motes, ou poemas de si e dos outros. Grande Batista, o poeta indigente, na sarjeta mas a declamar poemas dos maiores poetas do mundo, ou de seus poetas favoritos, como a fera dos pampas Mário Quintana.

Batista, Poe de Curitiba
ignorado por órgãos assistenciais

Batista de Pilar, o gênio incompreendido. Batista de Pilar, polêmico como Genet, Sade ou Lautréamont. Poeta a vagar pelas ruas, como fez o grande Edgar Allan Poe. Viva Batista, o poeta-mendigo de Curitiba, cujo lar é a escada da Casa Hoffmann, dormindo nas frias pedras do calçamento do Largo da Ordem, sem que ninguém o acolha, nem mesmo órgãos assistenciais. Caridade cristã, onde estás, que não respondes… Se consegue dormir naquele dia num pensionato ou naquele dia ter um sanduíche, é devido ao apoio de poetas que lhe pagam o pernoite daquele dia, ou lhe fazem camisetas com seus poemas para que possa vender.

Apoie o artista necessitado! Compre uma de suas camisetas! Ele irá lhe devolver um sorriso, e possivelmente lhe declamará um poema. Seus livros estão à venda na Feira do Poeta (Largo da Ordem), ou na barraca Escritibas, da Boca Maldita (Rua das Flores). Quaisquer doações podem ser feitas na coordenação da Feira do Poeta, com os coordenadores Geraldo Magela e Luiz Brizola.  


Batista de Pilar lê os jornais do dia, na Feira do Poeta de Curitiba, Largo da Ordem.
(Foto: Regina Bostulim).



Foto de Regina Bostulim


Alguns livros de Batista de Pilar:

- Príncipe sem trono, 2015
- Nona Cartada, 1992
- Em trânsito, quase, 1988
- Poesia Nossa de Cada Dia, 1985
- Impacto de Vozes, 1985

Parcerias musicais: Guego, Bhorel Henrique, Alecir Carrigo e outros.
Antologias: 101Poetas, antologia de poetas paranaenses, SEEC, 2015, é uma das mais recentes de que participou.

“Bartista”, tanka de Regina Bostulim. Grafite no Largo da Ordem.
(Foto: Regina Bostulim).

Poemas de Batista de Pilar

“sorte, mas que sorte”
(“bordão poético” com que inicia seus shows ou declamações)

“nas ruas de Curitiba tem tanta moça bonita”
(outro de seus “bordões poéticos”, paráfrase de Batista de Pilar a famoso poema de Mário Quintana em homenagem à cidade de Porto Alegre)


IRONIA

meu vizinho ainda ontem
não quis me dizer as horas
hoje me pede o relógio emprestado


INTERESSANTE

a formiga morder o elefante


NOTURNO

cordão de luzes
em eterna procissão
na cidade imensa

.

ainda resta poema
do pássaro que voou,
algumas gotas pequenas
mostrando que o rio não secou.

.

não olhes 
para o rosto
das pessoas que te evitam

cante para aqueles
que em você acreditam

.

todas as cachaças 
são perdoadas
porque é natural
vorta e meia
sair do ar

(Poemas do livro “Príncipe sem trono”, 2015, lançado na festa de retorno da Feira do Poeta. Feito à mão por Insight edições artesanais, numa iniciativa do poeta Geraldo Magela).

rengas de senryu
(provocação)
meus amigos 
são mais interessantes
que uma manada de elefantes
(batista de pilar)
(réplica)
meus inimigos
são mais refrescantes
que um engradado de refrigerantes
(regina bostulim)


(Provocações poéticas em que Batista e amigos se exercitam nas rengas de senryu, ou seja, fileiras de hai-kais humorísticos baseados na obra de Batista).



BATISTA DECLAMANDO 


https://www.youtube.com/watch?v=__S6TlsD1hI

https://www.youtube.com/watch?v=tqPb9G7smQc

https://www.youtube.com/watch?v=D-IU9D-KKXE

https://www.youtube.com/watch?v=gEH1D0gJS_k

https://www.youtube.com/watch?v=imVKmo7B7Kg

Batista em seu bar “Bartista”, que era localizado na Alameda Cabral. (arquivo: batista de pilar).


Batista de Pilar e sua melhor amiga, a maior poeta underground, musa da literatura marginal do Paraná, a poeta maldita Bia de Luna. No Bardo Cardoso, do poeta morretense (de Rio Sagrado), Alberto Cardoso (Bardo da Alameda Cabral). O local era reduto da inteligentsia curitibana. Durante os anos 80 e 90, Bia de Luna e Batista de Pilar eram vistos poetando pela noite de Curitiba. Frequentavam juntos o mesmo circuito de locais alternativos, eventos artísticos e literários de Curitiba. (arquivo: batista de pilar).



Avatar de Batista de Pilar no Facebook, cujo perfil foi criado e atualizado por amigos. Batista de Pilar não tem um laptop em que possa escrever seus poemas, apesar de ter à sua disposição, o wi-fi da Feira do Poeta e de outros locais do Largo da Ordem.
Batista de Pilar em Facebook: Joaoantoniobatistadepilar Batistadepilar.

Texto de Regina Bostulim

Comentários

  1. Obrigado Regina Bostulim!!! Nosso sincero 'Valeu' da mais alta consideração pela Arte e Poesia Paranense!Vamos em frente!!!

    ResponderExcluir

Postar um comentário