Jandira Zanchi: Quatro poemas



LIXO

enquanto os tais lírios do campo chicoteiam
seus murmúrios de susto (espanto/mendigos/pombas crianças
à mercê, chicote sem desejo)

rútila tarde campesina menina
centelhas de vermes (e famintos)
ao redor da ausência (de vida, de alimento, de deus)

entre o céu e o lixo
a mão que afaga.


Arte digital de Isabel Furini

Nosferatu

sem nexus
versus
controverso

amarelo anil
sem rima
pariu esquálidos fardos

nus/nubentes/novatos

nosferatu rimado
aguado e chato.


*

PASTOREIO

3 anéis em formatação livre
esculpidos e refazidos/remendados
arpoados de presunção

4 estrofes e nenhum mote
arcanjos e ninfetas
e belzebus e padre nossos
(aves marias para consumição do dia)

a vértebra e a careca do senhor

pastoreio na pele negra do arcanjo
é tua mirra (cálice santo da nave nubente)
entre brios e brioches e brados

a fuga do rastro, o rastejar do medo
e a dor na lua cinzenta de nosferatu.



*


LITERATURA

ave maria das letras
santa maria da ambição

alguma plateia
nenhum lunático, só bêbados e presunção

enquanto a Poesia continua vaga e vagante por dentre os
empecilhos de sempre/retida e mal contida
nas tardes de madrepérola arpoadas e prometidas
nos desvãos da mesma trilha (perfume/serpentinas e universo)

é estoica e pecaminosa (quase torta) e esquecida (não se importa)
e só comporta: a luz difusa do andarilho
a semente profusa dos não profetas
a palmilha torta dos adoradores das sombras (e da luz)

do Sol.


Jandira Zanchi é poeta, ficcionista e editora. Publicou O Vapor da Noite (singularidade, 2019), Egos e Reversos (singularidade, 2018), A Janela dos Ventos (singularidade, 2017), Área de Corte (Patuá, 2016), Gume de Gueixa (Patuá, 2013) e Balão de Ensaio (Proexto, 2007). Edita o portal Amaité Poesias & cia

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