FRACTAL
Vivo uma grande Lua.
Entre as ramas, com a carne silverada,
ouço seu chamado – vítrea escotilha
aberta à inundação de águas cegas.
Aluada, enluada, coberta do seu visgo doce,
espio a vida e subo por seu flanco.
Um deus debochado me observa.
Risca um novo esboço, prova meu gosto.
Na garganta dele, meu osso, minha luz, meu nojo.
Ele experimenta em mim todas as crenças.
Monta minha alma de archotes e lonjuras.
E lambe meu pescoço, insone e inconsequente,
enquanto a lua morde a minha língua,
expõe o avesso da palavra e sangra
a prata do luar dentro da boca.
Rosa Maria Mano
O VESTIDO
Usava um vestido amarelo
quando não queria ser apenas fantasia.
Matéria e véu, substrato sanguíneo, ouroboros.
Os fluídos e calores respirando, anfíbios.
Usava um cinto dourado de sóis aguerridos
Que preferiam ser pássaros, orquídeas, lírios.
Usava as mãos dele, sem que ele soubesse.
Desafivelando o cinto e libertando os pássaros,
Fazendo que se abrissem asas e florescências.
Rasgando os véus, na corrente apressada,
Sendo eterno, enquanto eu vivo.
Rosa Maria Mano
PUNHAL
Na funda rosa desgarrada, aprendo.
No jasmim que mostra os diferentes tempos da morte.
Morre a cor antes do perfume. O cheiro antes do fruto.
Um cálice envenenado me apresenta o vinho
da palavra que repica a verdade que não era.
Estar atenta ao instante preciso,
ao findar do lume e à escuridão que abraça
o amargo que relembra o doce.
Na parede do quarto, ensurdecida pelos chamados,
uma caricatura em vime, laço frouxo,
ríspida membrana que divide o fosso,
porosa e viciada, selo de inquietude.
Vivo mansarda em casa de barro,
ninho de pássaro-rendeiro que me vigia,
frio, a pele espessa que não aquece
E um punhal no bico que saboreia o golpe.
Rosa Maria Mano
Vivo uma grande Lua.
Entre as ramas, com a carne silverada,
ouço seu chamado – vítrea escotilha
aberta à inundação de águas cegas.
Aluada, enluada, coberta do seu visgo doce,
espio a vida e subo por seu flanco.
Um deus debochado me observa.
Risca um novo esboço, prova meu gosto.
Na garganta dele, meu osso, minha luz, meu nojo.
Ele experimenta em mim todas as crenças.
Monta minha alma de archotes e lonjuras.
E lambe meu pescoço, insone e inconsequente,
enquanto a lua morde a minha língua,
expõe o avesso da palavra e sangra
a prata do luar dentro da boca.
Rosa Maria Mano
Arte Digital de Isabel Furini |
Usava um vestido amarelo
quando não queria ser apenas fantasia.
Matéria e véu, substrato sanguíneo, ouroboros.
Os fluídos e calores respirando, anfíbios.
Usava um cinto dourado de sóis aguerridos
Que preferiam ser pássaros, orquídeas, lírios.
Usava as mãos dele, sem que ele soubesse.
Desafivelando o cinto e libertando os pássaros,
Fazendo que se abrissem asas e florescências.
Rasgando os véus, na corrente apressada,
Sendo eterno, enquanto eu vivo.
Rosa Maria Mano
PUNHAL
Na funda rosa desgarrada, aprendo.
No jasmim que mostra os diferentes tempos da morte.
Morre a cor antes do perfume. O cheiro antes do fruto.
Um cálice envenenado me apresenta o vinho
da palavra que repica a verdade que não era.
Estar atenta ao instante preciso,
ao findar do lume e à escuridão que abraça
o amargo que relembra o doce.
Na parede do quarto, ensurdecida pelos chamados,
uma caricatura em vime, laço frouxo,
ríspida membrana que divide o fosso,
porosa e viciada, selo de inquietude.
Vivo mansarda em casa de barro,
ninho de pássaro-rendeiro que me vigia,
frio, a pele espessa que não aquece
E um punhal no bico que saboreia o golpe.
Rosa Maria Mano
Lindos poemas. Paz e saúde Rosa, Gladys.
ResponderExcluirSonia, grata pela sua delicadeza. Paz e muita luz para você.
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