Das coisas
As coisas órfãs de luz
assaltam nossos azuis
dispersos. As peças vivas
- lavas de sombra à deriva -
zoam na humana paisagem
rente à linha de montagem
do desejo. (Ou cintilância
que o poder das coisas lança?)
Tralha que nos cerra os cílios,
vida, loja de utensílios,
víveres. Onde outros rumos
aos que no tecido ousem
roer o fio de prumo
dos que de coisas se cosem?
Salgado Maranhão, do livro Sol Sanguíneo
Quadro do artista Carlos Zemek |
Não te ceifaram as asas essas constelações
de pedra. Nem o furor da brisa rastejante.
Tua casa é uma língua de redemoinhos;
teus pássaros cantam para acordar a lua.
E seguirás a encurtar a noite com teu troféu
de órbitas. Rapara no orvalho sobre os
espinhos; na textura do que floresce e sangra.
Repara na noite que açoita
o voo solitário das rapinas.
Salgado Maranhão
(Do livro Avessos Avulsos)
*
CAPRICHO
É quase um capricho
estelar, este
rito de espanto
içado em mim; este
império de nuvens.
É quase um delírio:
com olhos de pântano
e línguas de cimitarra.
Ó vulcão de esplendores!
Não sei juntar
meus avessos;
não sei onde alugar
certezas.
Sei apenas que o amor
inventa oásis
para esconder incêndios.
Salgado Maranhão
*
ALQUIMIA
Minha África está repleta
em mim. E é dela que acordas
minhas transparências; e é
dela que alago as tuas vinhas
e os teus mistérios.
Tuas minhas Áfricas são meu refúgio
desesperado; donde serei
teu posseiro de reentrâncias; teu
imperador de afetos.
E é assim que quebrarei
tuas ânforas de mel
para doar teu néctar ao vento,
como quem parte um cristal
para torná-lo ouro.
Salgado Maranhão
Poeta José Salgado Maranhão |
Que beleza!
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