Franccis Yoshi Kawa: Alice e Thomas

 

 


Alice & Thomas

    Thomas se sentiu deslocado no novo colégio. Havia uma espécie de confraria de alunos. Para participar daquela comunidade tinha de bajular os líderes e maltratar aqueles que não se alinhava com eles. A regra não parecia justa.


    Por não querer se submeter estava sendo excluído de festas e confraternizações. Não se importava se era deixado de ser convidado para algum evento. Só ficava revoltado quando alguém usurpava seus direitos. Disfarçava o que sentia com sua máscara de indiferença. No seu ponto de vista a escola era o reflexo daquela cidade. O problema estava na cidade segregacionista que considerava alguns como escórias da humanidade, mesmo sem ter nada que justificasse.


    Thomas preferia a companhia de desconhecidos. Era bem tratado por eles até saberem que ele era o "esquisitão”. Lembra quando Alice chegou transferida de um outro colégio. Ela o olhou com simpatia e disse "oi”, mas ele em resposta resmungou qualquer coisa. Ficou sem jeito. As garotas não costumavam se dirigir a ele. Arrependeu-se por ter sido ríspido. Por outro lado consolou-se dizendo que ela se afastaria dele ao saber quem era ele, o esquisito da turma.


    Por ser bela e simpática foi bem recebida no grupo. Não foi bem interpretada, pois ser simpática não era sinônimo de oferecida. O clima mudou logo que ela se negou a aceitar as regras daqueles que mandavam no lugar. Passou a enfrentar calúnias, boatos e mentiras. Em pouco tempo ela era a "mal falada”.

    Ele a encontrou novamente. Ela o olhou com indiferença ao lembrar do momento em que se conheceram. Estava triste e aborrecida caminhando sozinha a beira de um lago.  Ela era livre. Livre para vestir a roupa que quisesse. Livre para pentear e se maquiar como estrela de cinema. Livre para contrariar a família, os amigos, seja lá quem fosse. Embora não pudesse ser livre naquela cidade cheia de olhos e bocas vomitando maledicências.


    Começaram a conversar. Ninguém se interessava em saber o que ele sentia por ela. A maldade era coletiva, seletiva e oportunista. Não podia ver as pessoas maltratadas se confraternizando. Odiaram ver que se ajudavam mutuamente e pareciam felizes. Os líderes preconceituosos que manipulavam as pessoas decidiram que havia chegado a hora de acabar com aquela alegria. O Thomas era o odiado. A Alice era apenas a "mal falada”. As pessoas não podiam aceitar a felicidade de Thomas. Portanto, aquele amor era uma afronta.


    Deixou de ser conspiração de alguns para ganhar adesão de outras pessoas. Por outro lado, nem todas as adesões eram de pessoas más. Só algumas eram mal intencionadas. Eram pessoas que deixaram de questionar se era justo maltratar pessoas que mal conheciam.


    Até que, num belo dia, Alice desapareceu sem dizer nada. A família nunca se importou com o que ela fazia. Rejeitava Thomas, mesmo sem qualquer motivo. Incomodavam-se ao ouvir falar que o "esquisitão” estava com a Alice. Decidiram que tinham que acabar com ele e apressaram-se em atirar a primeira pedra.


    Não havia passado vinte quatro horas após a Alice sair de casa e ser vista pela última vez. Nem a polícia foi avisada. Mas, não importava. Estavam todos empenhados em fazer o que parecia certo. O corpo de Thomas apareceu enforcado no arco de um monumento na Praça dos Justos. A família se sentiu de alma lavada. Tinha lavado a honra da Alice. Possivelmente ela estaria de volta em breve. Haviam omitido a informação de que ela tinha costume de desaparecer quando estava contrariada.

Franccis Yoshi Kawa

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